quarta-feira, 12 de março de 2008

Células-tronco embrionárias ou seres humanos embrionários?

Células-tronco embrionárias ou seres humanos embrionários?
Imagine que uma mulher está há duas semanas com a menstruação atrasada e, desconfiada, compra na farmácia mais próxima da casa dela um teste para gravidez. Sentindo os sintomas básicos de uma provável gravidez ela faz o teste com quase certeza do resultado que aparecerá. Depois de alguns minutos de colher o material, a cor do teste se modifica e suas suspeitas se confirmam: ela está grávida. Minha pergunta é: ela está grávida de quê?
Há algum tempo atrás a resposta a essa pergunta seria óbvia: ela está grávida de um bebê. Mas o que entendemos pela palavra “bebê”?

Marcos David Muhlpointner
Biólogo pela Univ. Mackenzie e professor de Ciências e Biologia em colégios particulares de São Paulo. Membro da Comunidade de Jesus - São Bernardo do Campo, exercendo os ministérios de música e de pregação. Faz palestras sobre bioética, ciência e fé e atualmente está preparando um livro sobre Bioética à luz da Bíblia.


Imagine que uma mulher está há duas semanas com a menstruação atrasada e, desconfiada, compra na farmácia mais próxima da casa dela um teste para gravidez. Sentindo os sintomas básicos de uma provável gravidez ela faz o teste com quase certeza do resultado que aparecerá. Depois de alguns minutos de colher o material, a cor do teste se modifica e suas suspeitas se confirmam: ela está grávida. Minha pergunta é: ela está grávida de quê?

Há algum tempo atrás a resposta a essa pergunta seria óbvia: ela está grávida de um bebê. Mas o que entendemos pela palavra “bebê”? Certamente entendemos que se trata de um ser humano pequeno e indefeso, ou seja, uma criança. Também usamos esse termo logo depois do nascimento para designar aquele ser frágil e delicado, que carece de inúmeros cuidados.

Pois é, meus queridos leitores, e minhas queridas leitoras também, para alguns cientistas, e acho que para alguns evangélicos também, essa mulher hipotética da nossa história acima não está grávida de um ser humano. Para alguns outros cientistas, essa mulher não está grávida nem de uma pessoa. Hoje em dia, se você não sabe, os estudiosos fazem diferença entre o que é uma pessoa e o que é um ser humano. Vou tratar disso oportunamente, mas a princípio, basta dizer que muitos encaram a possibilidade de um ser humano não ter pessoalidade, ou seja, não ser uma pessoa.

Agora, nesse momento de euforia e alegria dessa mulher, fale a ela que ela não está grávida de um bebê, e sim de um amontoado de células que, potencialmente, poderão se transformar num bebê; quem sabe numa pessoa. Imagine dizer a ela que ainda não é um ser humano que está dentro dela, que ainda a vida não começou dentro dela. Como ela se sentiria ao saber que toda essa alegria pode não se confirmar! Bem, estou raciocinando de modo bem especulativo. Entretanto, temos essa realidade nos nossos dias. Cada vez mais cresce o debate em torno de quando começa a vida, particularmente a vida biológica.

Existe uma expectativa muito grande — e muitos cientistas até prometem — para a cura de determinadas doenças a partir da pesquisa com células-tronco embrionárias. Como já tratei no artigo anterior a esse, essas células-tronco embrionárias podem se transformar em qualquer um dos tecidos humanos. Doenças neurológicas degenerativas, como o Parkinson ou Alzheimer; doenças musculares, como a distrofia ou paralisia; males como a paraplegia ou tetraplegia, ou o diabetes entre outros, poderiam ser resolvidos a partir das células-tronco.

Vou explicar melhor. Suponha que alguém desenvolva o Mal de Parkinson. Essa doença é caracterizada pela morte ou perda da capacidade de alguns neurônios de controlar os movimentos musculares. Por causa disso, essa pessoa apresenta tremores, rigidez muscular, dificuldade de andar e se locomover. Como esses neurônios vão morrendo lentamente, há uma progressão paulatina da doença. Como esse neurônios morrem, eles deixam de fabricar a dopamina, uma substância capaz de mediar a atividade desses neurônios.

Até hoje não há métodos para a cura dessa doença. Trata-se de uma doença degenerativa, para a qual os tratamentos são para a reposição da dopamina e o controle de seu avanço. Os neurônios - células do sistema nervoso - não têm capacidade regenerativa, ao contrário das células da pele. Se você se cortar o ferimento se fecha e uma nova camada de células forma a pele novamente. Com os neurônios isso não acontece. Apesar dos estudos sobre regeneração neuronal avançarem, ainda são bastante incipientes. Esse é um caso em que as células-tronco poderiam ter sucesso. Faríamos uma cultura de células-tronco a fim delas se transformarem em neurônios e as colocaríamos no cérebro dessa pessoa doente. O problema é: podemos fazer experimentos com células-tronco embrionárias?

Um adulto tem células-tronco na medula de seus ossos, principalmente o osso da bacia, mas essas células perderam a capacidade de se transformar em todos os tecidos. Elas podem se transformar num número menor de tecidos. E a grande discussão ética está aqui: usar ou não as células-tronco embrionárias disponíveis.

Hoje muitas clínicas já guardam células-tronco retiradas do cordão umbilical, logo depois do parto. Mas mesmo essas células do cordão umbilical não têm a mesma capacidade de diferenciação das embrionárias. É por isso que, para a comunidade científica, as células-tronco embrionárias se transformaram no “objeto de desejo”.

Percebeu onde quero chegar? As clínicas de fertilização possuem milhares de embriões congelados. Todos eles, congelados com algumas dezenas de células, todas indiferenciadas, podendo se transformar em milhares de seres humanos, se implantados nos úteros das mulheres. É muito conveniente, por exemplo, um cientista afirmar que só podemos considerar um ser humano quando se forma o sistema nervoso, lá para a 8ª semana de gestação, quando ele está interessado em usar células-tronco embrionárias. Isso aliviaria a consciência e descriminalizaria o procedimento científico.

Ainda vou desenvolver mais esse tema com vocês, mas por hora quero terminar com algumas questões para o próximo artigo:

Até que ponto podemos dispor da vida humana?
Será que todo o conhecimento científico que temos hoje nos legitima a usá-lo?
O que fazer com os embriões congelados que não serão utilizados para engravidar uma mulher?

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